quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Conto: A guerra interminável

O rádio relógio tocou. Amanda apenas esticou o braço e desligou o despertador. Continuou deitada em posição fetal, debaixo do edredom, deixando apenas sua cabeça do lado de fora. Com os olhos fechados, pensava de onde tiraria forças para levantar e viver o seu dia. Essa era a sua rotina de todas as manhãs. Poderia ligar para o trabalho e dizer que não iria, mas isso só iria resolver o problema do dia de hoje. Qual seria a desculpa de amanhã? A pior parte do seu dia não estava apenas em ter que se levantar ou se arrumar ou pegar condução cheia, estava  na parte em que precisava forçar o sorriso e responder: "Estou bem" para cada "Tudo bem?".
Aprendeu da pior maneira que não deveria conversar com qualquer pessoa sobre o que pensa ou sente ou até mesmo, como vê o mundo.
"Você precisa querer melhorar"
"Você só está assim porque quer"
"Isso tudo é coisa da sua cabeça"
"Se você não pensar sobre isso, vai melhorar"
"Tudo frescura, no meu tempo não tinha isso"
"Você tem que mudar o seu jeito de pensar"
Ela só queria alguém que a entendesse e a abraçasse. Ela sentia falta de abraços. As pessoas hoje em dia não abraçam com vontade, abraçam só para cumprimentar e usam um abraço vazio e sem significado. Sempre se sentia só, mesmo rodeada de pessoas, estava sozinha e perdida. Tem dificuldades para pegar no sono, mas ultimamente tem chorado até dormir. Conta ansiosamente a chegada do final de semana, só para se trancar em casa e não precisar de desculpas por não querer sair da cama. Chegou a pensar em suicídio, pesquisou maneiras, meios e métodos de fazer isso e, logo após achou que poderia ser salva, no último momento. Na pior das hipóteses, ela poderia morrer sozinha, ninguém sentiria sua falta e só encontrariam o seu corpo, dias depois, ao sentirem seu odor pútrido. Ninguém deveria morrer sozinho. Afastou esse tipo de pensamento, não para sempre, mas por tempo indeterminado.
Seu celular vibra.
"Você não está sozinha. Levante e venha tomar café comigo. Te amo", dizia a mensagem da sua amiga.
Talvez, por um momento, ela não estivesse tão só. Está olhando para o ângulo errado, de uma perspectiva diferente. Talvez, tem alguém sim que se importa com ela. Quem sabe não ganha um abraço. Esse pensamento a fez sorrir na alma.
Levantou, com muito custo da cama, se arrumou e foi para mais um dia de batalha consigo mesma. Batalhas de uma guerra interminável.

Nenhum comentário:

Postar um comentário